Locação de imóveis durante o período de pandemia

Diante do atual cenário de pandemia, muito questiona-se sobre a manutenção dos contratos de locação residenciais e não residenciais, bem como a possibilidade de redução do aluguel ou mesmo a resolução do contrato.

Cumpre salientar que, apesar dos inúmeros questionamentos, nenhuma legislação específica discorreu sobre o tema, causando certa insegurança jurídica, além de divergências.

O texto inicial do Projeto de Lei 1.179/2020, que deu origem a Lei 14010/2020, dispõe sobre o Regime Jurídico Emergencial e Transitório das relações jurídicas de Direito Privado no período da pandemia da Covid-19 (RJET) e previa diversos artigos sobre a locação de imóveis. Todavia, o capítulo que tratava sobre o tema foi praticamente suprimido após a aprovação na Câmara, restando, ao final, apenas o artigo que proibia a concessão de liminar para desocupação, nas ações de despejo distribuídas a partir de 20 de março de 2020 (artigo 9º).

Tal dispositivo garantia ao locatário a permanência no imóvel, impedindo que o locador se utilizasse das liminares de despejo para retirá-lo de imediato do bem, em ações posteriores ao início das medidas de isolamento social.

Ocorre que, ao seguir para a sanção presidencial, diversos artigos da Lei foram vetados, inclusive o art. 9º que impossibilitava, temporariamente, a concessão de despejo liminar em contratos de locação urbana, não restando mais nenhuma previsão legal acerca das locações.

Dessa maneira, persistem as incertezas sobre tais contratos no período de pandemia, restando as partes recorrer aos Tribunais. De acordo com recentes julgados, existem duas correntes jurisprudenciais: a primeira entende que o atual cenário não permite alterações no valor das locações, pois a moratória não poderia recair sobre os locadores, e a segunda a favor da readequação do valor das locações, em razão do desequilíbrio gerado na relação contratual por conta da pandemia, além de uma possível excessiva onerosidade ao locatário.

Com relação à primeira teoria, as decisões alegam que a redução do valor dos aluguéis deve ser negociada com o locador, até mesmo para possibilitar a este que mantenha suas obrigações pessoais, isso porque o judiciário não pode compelir o locador a negociar contra seus interesses.

Em recente decisão, o Tribunal de Justiça de São Paulo, inclusive, cassou a liminar que suspendia temporariamente o pagamento de alugueis de uma rede de lojas em um shopping da Capital, sob a alegação de que a intervenção do Poder Judiciário em contratos privados, somente deve ocorrer em casos excepcionais e quando houver notável desequilíbrio contratual ante o caso concreto.

Já a segunda corrente, prevê decisões que vão de encontro com esses argumentos e concedem descontos nas locações enquanto durar a pandemia, sob a ótica de que estamos diante de casos de força maior ou caso fortuito.

Conforme demonstrado acima, é cediço que a pandemia do novo corona vírus impactou em todos os setores econômicos, ensejando, além do pedido de redução dos valores, a resolução de contratos.

Isso porque, o art. 478 do Código Civil garante que, em virtude de acontecimentos extraordinários, se o contrato se tornar excessivamente oneroso, a ponto de causar um desequilíbrio entre as partes, é possível requerer a resolução do contrato.

Para tanto, será necessária uma análise individualizada, com base nas circunstâncias relevantes e à luz da legislação aplicável, de modo a verificar e avaliar eventuais impactos concretos, que provem eventual desproporção ou desequilíbrio decorrente de seus termos e que conduzam a onerosidade excessiva para uma das partes.

Com relação ao pedido de resolução do contrato por mera alegação de prejuízos decorrentes do atual cenário, tal medida também dependerá do caso concreto, pois via de regra as relações contratuais são firmadas desde o início com o objetivo de serem cumpridas, com base no princípio do pacta sunt servanda, e assim, para que sejam resolvidos, será necessário a comprovação dos prejuízos sofridos.

Posto isso, conclui-se que, por não haver culpa de qualquer das partes, devem ser estimuladas a criação de um ambiente de acordo e tratativas antecipadas sempre pautadas na razoabilidade e proporcionalidade, com o objetivo de abrandar os prejuízos que atingem toda sociedade. A busca pelo equilíbrio nos contratos imobiliários, principalmente a que se refere a locação, por meio de arbitragem ou acordo extrajudicial, para adequação do contrato que se alterou em razão da quarentena, é a principal saída, permitindo uma solução amigável.

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